Disputa do tráfico faz Jequié ser a cidade mais violenta do Brasil
O estado da Bahia concentra seis das dez cidades grandes e médias que tiveram maior taxa de mortes violentas intencionais em 2022, apontam dados do anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgado nesta quinta-feira (20).
O levantamento revela que Jequié (a 370 km de Salvador) foi a cidade brasileira com maior média de assassinatos proporcional à sua população, atingindo um patamar de 88,8 mortes por cada 100 mil habitantes. Outras três cidades baianas aparecem na sequência encabeçando a lista: Santo Antônio de Jesus, Simões Filho e Camaçari.
Completam a relação das cidades mais violentas, na ordem, Cabo de Santo Agostinho (PE), Sorriso (MT), Altamira (PA), Macapá (AP), Feira de Santana (BA) e Juazeiro (BA).
O levantamento leva em conta os municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes, o que inclui cidades grandes e médias, segundo tipologia usada pela ONU (Organização das Nações Unidas).
Para chegar ao número de mortes violentas, são somados os indicadores de homicídios, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte, policiais militares e civis vítimas de mortes violentas e mortes decorrentes de intervenção policial.
Levando em conta os 50 municípios mais violentos dentre aqueles com mais de 100 mil habitantes, 27 são cidades da região Nordeste. Outras 11 são de estados da região Norte, 6 do Sudeste, 5 do Sul e 1 do Centro-Oeste. Apenas quatro capitais compõem a lista: Macapá, Salvador, Manaus e Porto Velho.
A despeito da concentração no Nordeste, a região, ajudou a puxar a redução no número de mortes violentas em 2022, com queda nos indicadores em seis estados: Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Rio Grande do Norte, Sergipe.
Na Bahia, estado com maior número absoluto de mortes violentas do Brasil desde 2019, houve uma queda de 5,9% no nas ocorrências, saindo de 7.069 casos em 2021 contra 6.659 no ano passado.
Os indicadores, contudo, mostram um espraiamento da violência por cidades do interior do estado, superando uma concentração que anteriormente existia em Salvador e região metropolitana.
“Esse movimento de interiorização da violência letal chegou ao Nordeste e deve chegar também no Norte. É um processo que a gente está entendendo, mas que sinaliza para novos arranjos das facções criminosas”, afirma Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Ele destaca que este movimento sinaliza que o poder público está conseguindo dar respostas à violência letal nos grandes centros, criando desarranjos e causando um recrudescimento das disputas entre facções em cidades menores.
Em Jequié, cidade que proporcionalmente teve mais mortes violentas intencionais, a escalada da violência é resultado do avanço do tráfico de drogas que desencadeou uma disputa entre grupos criminosos. A cidade, com população de 158 mil habitantes, registrou 142 mortes violentas no ano passado.
O crescimento do número de crimes violentos motivou uma audiência pública na Câmara de Vereadores em setembro do ano passado. Na ocasião, o delegado regional Rodrigo Fernando disse que o avanço da violência era provocado pela disputa por controle do comércio de drogas por facções criminosas.
A disputa escalou após a prisão de um dos líderes do tráfico na cidade em março após uma operação conjunta entre a Polícia Civil da Bahia e de São Paulo. No mês seguinte, o líder do grupo rival foi preso na cidade de Cuiabá (MT).
Em maio, a Polícia Civil chegou a fazer uma operação para combater as ações das duas organizações criminosas que atuam em Jequié. Foram cumpridos 12 mandados de busca e apreensão e duas pessoas foram presas em flagrante.
O cenário é semelhante em outras cidades médias baianas, que viram a violência escalar nos últimos meses. É o caso de Santo Antônio de Jesus, que também enfrenta uma ferrenha disputa de facções.
Na avaliação de Lima, do Fórum, o espraiamento e interiorização da violência tornam ainda mais urgente uma política nacional de segurança pública que integre as ações de União, estados e municípios.
“Política nacional de segurança é diferente de gestão da atividade policial. É preciso coordenar esforços a partir de diretrizes que vêm do Executivo. A polícia não é autônoma, ela tem que seguir um comando político que determine as metas e coordene os esforços”, afirma.
De acordo com ele, é necessário, sobretudo, melhorar a qualidade da investigação no âmbito da Polícia Civil.
A falta de uma política de segurança que fortaleça as ações de prevenção reforça o discurso de enfrentamento ostensivo, que não raro resultam em operações com uso excessivo da força policial.
No ano passado, apontam dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a Bahia foi o estado que mais registrou mortes decorrentes de intervenção policial em números absolutos. Ao todo foram 1.464 ocorrências.
“É legítimo que o policial se defenda, mas é preciso entender os padrões que estão gerando o uso excessivo de força. Esta é a forma mais adequada de garantir mais segurança para a sociedade? Com esses padrões, acredito que não”, avalia Renato Sérgio de Lima.
*Política Livre
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